História de uma negociação trabalhista
Em
um processo produtivo marcado pela automação o trabalhador já não tem poder de
barganha na negociações com o patrão. A reforma trabalhista trabalhista posta
em vigor recentemente no Brasil agrava
essa situação e tem como efeito imediato a fragilização do trabalhador diante
do empresariado. O argumento daqueles que a defendem é de que ela permite a inclusão de um contingente
significativo de trabalhadores informais existentes atualmente. No entanto,
essa inclusão não deve ser feita à custa de direitos conquistados à duras
penas.
É verdade que desde os primórdios
da Revolução Industrial a classe operária sempre enfrentou dificuldades para
conquistar direitos, ainda que mínimos. De modo geral, sempre houve farta
disponibilidade de mão de obra e o processo produtivo é organizado de modo
que o trabalhador ausente por quaisquer
motivos possa ser prontamente substituído e a produção nunca se interrompa.
Ruínas da Tecelagem Santa Bárbara, localizada no município mineiro de Augusto de Lima. Imagem: Magna Santos |
Por isso causa estranheza que
situações como a que passamos a narrar em seguida tenham acontecido nos primeiros
tempos da industrialização em Mina Gerais. Assim como na Europa e nos Estados
Unidos, aqui no Brasil a indústria têxtil foi a primeira a se desenvolver. No
sul de Minas Gerais e nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, a mão de obra
utilizada foi essencialmente a de imigrantes. No Centro e Norte mineiros,
porém, o trabalhador autóctone constituiu a principal força de trabalho,
principalmente para as tarefas mais simples, que não exigiam especialização.
Para as tarefas especializadas, que exigiam conhecimentos
técnicos, houve, em um primeiro momento,
a importação de mão de obra. No entanto, o alto custo
representado pela contratação desses profissionais despertou a necessidade da
formação de técnicos nacionais.
Alguns profissionais eram
decisivos para o sucesso da empresa. O tintureiro, por exemplo, embora quase
sempre fosse um profissional prático, sem maiores conhecimentos teóricos em
química, detinha um saber essencial no processo da fabricação de tecidos. Isso
garantia ao profissional um poder de barganha significativo no estabelecimento
de suas condições de trabalho e remuneração.
Em seu livro “Fábrica: Convento e
Disciplina”, Domingos Giroletti relata uma situação que exemplifica bem isto.
No final do ano de 1881, a Companhia Cedro e Cachoeira, localizada no povoado
do Cedro (hoje, cidade de Caetanópolis), no interior de Minas Gerais, contratou
o português José Antonio da Silva como tintureiro. A empresa pagou as despesas
de viagem do operário e de sua família, do Rio de Janeiro, onde residiam até a
Vila Operária.
Seu contrato, de três anos , a
contar de 1º de janeiro de 1882, previa a concessão de uma casa para a
residência da família e remuneração de seis mil réis diários. Para fins de
comparação, no ano de 1887, um ajudante de urdume ganhava 800 reais diários e
um ajudante de filatório, função exercida geralmente por crianças, recebia
cerca de 34 réis a hora. Findo esse prazo, o contrato foi renovado
sucessivamente, sempre com aumentos substanciais na remuneração.
No ano de 1891 a empresa não se
dispôs a pagar o valor exigido pelo sr. José Antonio e ele deixou o trabalho.
No entanto, sua saída acarretou em queda na qualidade dos tecidos produzidos
pela fábrica, os clientes passaram a reclamar e houve redução nas vendas. O
tecidos produzidos pela empresa, até então conhecidos por sua alta qualidade e
firmeza das cores, perderam mercado para os concorrentes. Diante disso, os
acionistas pressionaram o superintendente da Companhia pela readmissão do
antigo tintureiro. José Antonio da Silva retornou à empresa em condições ainda
mais favoráveis.
Hoje em dia, que profissional,
por mais qualificado e competente que seja, pode negociar em termos tão
vantajosos com seus patrões?
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