Os dilemas de quem vive na roça
O
dilema vivido pela população rural diz respeito ao acesso aos bens de consumo.
A pessoa vive ali, no paraíso, não tem poluição, trânsito caótico, a ameaça dos
assaltos e arrastões. No entanto, ela sabe das facilidades da modernidade, dos
recursos tecnológicos; deseja consumir. Estar inserido no mercado de consumo é
condição para realização pessoal. Não se trata de discutir se isso é bom ou
ruim. Trata-se de perceber o fenômeno.
As populações rurais desejam realização
pessoal, profissional e intelectual. É por isso que migram. Buscam nas cidades
o mundo idealizado da televisão. As cidades representam possibilidade de
crescimento e desenvolvimento. No entanto, a cidade já não consegue atender às
necessidades de seus habitantes. E a cada dia chega mais gente.
Mesmo que essas pessoas consigam
estudar, ter bons empregos, são emigrantes, expropriados de sua cultura, de
suas origens. É inegável a perda da identidade.
O desafio do desenvolvimento rural
pressupõe alguns aspectos:
*Para quem deseja morar e trabalhar
no campo: escolas de formação agrícola, acesso a meios de comunicação e
transportes;
*Para quem deseja morar no campo e
trabalhar nas cidades: principalmente infraestrutura, meios de comunicação e
transportes;
No entanto, as pessoas que moram no
campo passaram a enfrentar problemas antes considerados tipicamente urbanos:
assaltos, roubos, enfim, a violência já chegou às paisagens bucólicas da zona rural.
Em 1995 eu era professora de
Geografia em uma turma de alunos provenientes da zona rural. O Governo de Minas
Gerais dera início a um programa de ampliação da oferta de vagas nas escolas
públicas estaduais e de transporte escolar para alunos da zona rural. Inúmeros
adolescentes e jovens passaram então, a frequentar a escola; havia um
entusiasmo muito grande.
Numa das aulas eu contava a minha
experiência. Também viera da “roça” como eles, conseguira fazer o curso
superior, dava aulas (um sonho antigo) e optara por permanecer na “roça”, pois
acreditava ser capaz de promover meu desenvolvimento sem a necessidade de
emigrar de meu território. Por tanto, eles também poderiam aproveitar aquela
oportunidade de estudar para melhorar suas condições de vida e das comunidades
das quais faziam parte.
Meus alunos caíram na risada! Onde
já se viu? Estavam ali, sim, para estudarem, aproveitarem a oportunidade de
crescimento e conseguirem um bom emprego na cidade. Não queriam continuar
morando no campo, trabalhando em serviços pesados, com uma renda ínfima, sem
poder contar com recursos como computadores, eletrodomésticos modernos,
aparelhos eletrônicos, facilidades de locomoção e comunicação. Na visão deles,
a “roça” seria um lugar para passear de vez em quando; para morar, não.
A reação de meus alunos exemplifica
os dilemas vividos pela população camponesa: o mundo rural já não é capaz de
proporcionar a realização pessoal de seus habitantes. Prova disso são os
intensos movimentos migratórios que “incham” as cidades a cada dia. Por outro
lado, as cidades também se mostram incapazes de atender às demandas de sua
crescente população. Quem chega do campo à procura de melhores condições de vida
encontra desemprego, déficit habitacional, violência.
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